Saturday 29 November 2008

ÍNDIA

Himachal Pradesh - Chamam-me Arjuna
Chamam-me Arjuna.
O vento proclama os meus feitos. Contos, lendas ou simplesmente boatos, fazem-nos deitar-se na boca de uma mulher de jovem idade, que nunca conheci. À volta da fogueira numa noite de Inverno frio, eles juntam-se para louvar e matar fantasmas, ou demónios, pela espada no sangue do campo de batalha. Mas verdade é, as nuvens pretas por cima do vale carregam tristezas, e a penitência é demasiada pesada para as minhas costas, as mulas estão exaustas debaixo do peso dos meus pecados, e o meu castigo escurece todo o amor e a irmandade dos meus olhos. Assim o ódio é a sombra que supera a sanidade dos meus actos e feitos, quando agarro o pescoço destes homens novos e os afugento para longe, mandando-os para os infernos mais escuros para o resto das vidas insignificantes deles.



Danação eterna para os meus inimigos, hão-de arder na estupidez deles. A culpa não assustará a minha mão quando as palavras não vingam, farei com que as suas faces tocam o chão debaixo do meu pé, assim será.

A paz silenciosa da destruição que flutua depois da batalha, invade a minha alma, desvanece a violência, posso erguer novamente a minha cabeça por cima das nuvens, e o meu rosto é abençoado pelo calor do sol.

Meu é nome é Arjuna e é um nome bom que eu recupero. Eu sou Arjuna e lavarei os seus pés antes de beijá-los, porque posso ver o seu rosto sorrindo-me sem estar aqui.

Os corvos gritam o meu nome lá no topo, nas altas montanhas.

Monday 17 November 2008

ÍNDIA

Himachal Pradesh - Um homen que sabe o seu caminho
"Um homem que, ali, sabe o seu caminho, pode desfiar a polícia da capital de Verão da Índia, tão engenhosamente uma varanda comunica com outra varanda, alada com alada, e abrigo secreto com abrigo secreto. "
in Kim por Rudyard Kipling

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Todas as princesas da Índia fixam através das suas janelas decoradas de madeira cinzeladas, a fim de verem esta caravana passar pelas aldeias, sofrendo as pesadas quedas de neve dos Himalayas. Elas expõem a sua pele delicada à luz do dia para desejá-lo fortemente, estimulando essa coisa quente entre as pernas. Mas ele não pode parar a viagem da sua caravana, como o músico itinerante, o marido ciumento lhe cortaria a cabeça só por um olhar.

Oiçam todos os anjos de Deus choram, o coro canta Lacrimosa neste Requiem, mais uma lenda está prestes a cair. Kim está deitado agonizando no seu leito de morte. À medida que as nuvens negras cobrem a luz do dia, o fim torna-se cada vez mais próximo, mais assustador e angustiante do que nunca.

Um macaco quase me roubou os meus óculos quando estava a deixar Jaku Mandir em Shimla. Ele saltou para a parte de trás do meu ombro, agarrou-me e tentou tirar-me os meus óculos da cara. Felizmente, fui mais rápido do que ele, tirei-os antes mesmo antes de ele amarrar na armação. O sacana não desistiu sem os entortar. Curiosamente, o templo alberga Hanuman, o Deus Macaco, comandante dos exércitos de macacos no Ramayana.

Uns dias depois, vim a saber que Hanumam também Senhor da respiração, Filho do Deus do vento, tem cinco faces e vive em nós sob a forma de cinco ventos ou energias, e impregna o nosso corpo, mente e alma...
in Light on Pranãyãmã por B.K.S. Iyengar

De volta em Odder, os pássaros ainda cantam. Os campos tornam-se verdes, à medida que se aproxima a primavera.

Fui para as montanhas. Aí, os corvos crocitavam que Kim tinha desaparecido numa pesada tempestade de neve. À partir de então, mais ninguém soube do seu destino.

Acerca do sino budista que chama para o Puja, enquanto os crânios rapados juntam-se numa assembleia em meia lua, cantos religiosos são cantados na alegria budista. Os trajes púrpura escura, parados ao sol, sentavam-se em uníssono perto das folhas grandes das árvores fruteiras.

Vozes femininas que recitavam cantos religiosos, ouviam-se na noite.

O chá doce e o chá salgado
As monjas, as chomos, trazem a comida para o almoço e para o jantar, pelo caminho de terra no qual a Svastika e as Quatro Jóias do Budismo foram desenhadas. Fazem-no todos os dias, por volta de mais ou menos a mesma hora, devagar sem pressas, e trazem o chá doce ou o chá salgado a fim de aclamar as nossas almas com sede.

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Por volta de 1900, um monge japonês budista zen, viajou vários anos entre a Índia e o Tibete. Ficam aqui alguns dos seus comentários.

Acerca do estilo dos debates tibetanos:
"... Quando ele (um dos participantes) profere as palavras de uma pergunta, ele bate com as mãos e os pés. O professor ensina sempre os catequista que o pé devem cair com tal força que a porta do inferno partirá e abrirá, e as mãos devem fazer um barulho tão grande que a voz da sabedoria assustará os demónios pelos mundos fora..."
Ekai Kawaguchi

No Tibete, o Funeral Celeste consiste em cortar os cadáveres dos mortos em bocados mais pequenos, e de deixá-los num lugar aberto a fim de alimentar os abutres. Entre os monges tibetanos, alguns são responsáveis por esta preparação.

"... Eles preparam o chá, ou ajudam-se a si próprios para cozer farinha, com as mãos salpicadas com puré de carne humana e ossos, porque eles nunca lavam as mãos antes de preparar o chá ou de tomar comida, a única coisa que eles fazem é bater com as palmas, a fim de livrar dos fragmentos mais grosseiros. E assim tomam uma boa quantidade de carne moída, ossos ou cérebro, misturada com o chá ou a farinha... Quando sugeri que eles podiam lavar as mãos antes de tomar refrescos, olharam para mim com ar de espanto. Zombaram a minha sugestão, e ainda observaram que comer com as mãos por lavar adicionava condimento à comida; além disso, o espírito do defunto estaria satisfeito se os visse tomar fragmentos dos seus restos mortais com a comida sem aversão."
Ekai Kawaguchi

Tudo parece muito mais claro agora que a neblina desapareceu da minha mente. As montanhas são chamadas montanhas, os vales, vales, e os cumes com neve tornam-se mais distintos à medida que são atingidas alturas nunca vistas. Estive cego durante mil anos, estava a imaginar paisagens diferentes e outras imagens. Apesar de tudo, o caminho para dentro das profundezas do vale é longo mas extremamente gratificante. Guia o meu pé nesta viagem de maneira a que não me afaste.

Não confio nestes homens que caminham de mão dadas na rua, e que sentam nos joelhos uns dos outros.

O meu barco foi afundado por piratas no rio. Vagueio agora, pela selva, há dias a fio sem ver rasto humano. Estou provavelmente a caminhar e círculos.

Não há futuro, não há passado, mas apenas e somente presente, principalmente e essencialmente agora, aqui e nada mais. Não há memórias passadas, não há experiências esquecidas, não há tristeza, não há remorso, não há escravatura, não há afeição ao que não existe, e por isso, inalcançável e ilusório futuro. Mas alegria sem fim no momento presente.

Não existe possibilidade de retratar tamanha beleza, apenas uma ínfima parcela consegue ser memorizada. Porém, ela pavoneia-se em frente dos nossos olhos, sem que possa fazer coisa alguma a fim de possuí-la.

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Não consigo desenhar o som contínuo e nocturno dos insectos nem o insuportável calor tropical.

Sunday 2 November 2008

INDIA

Himachal Pradesh - A man who knows his way
"A man who knows his way there can defy all the police of India´s summer capital, so cunningly does verandah communicate with verandah, alley-way with alley-way, and bolt-hole with bolt-hole."
Rudyard Kipling

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All the princesses of India stare through their wood-carved decorated windows to look at this caravan passing through the villages, suffering the Himalayan heavy snow falls. They expose their delicate skin to daylight to strongly desire him, arousing that warm thing between their legs. But he cannot stop his caravan’s journey for like the itinerant musician, the jealous husband would chop his head off for just one look.

Listen all God’s angels are crying for the choir sings Lacrimosa in this Requiem, one more legend is about to fall. Kim is lying agonizing in bed of death. As the black clouds cover daylight, end becomes closer and closer, more frightening and anguishing than ever before.

A monkey almost stole my glasses when I was leaving Jaku Mandir in Shimla. He jumped on the back of my shoulder, grabbed me and tried to take my glasses off my face. Fortunately, I'd been quicker than him, I took them off just before he grabbed the frame. The bastard didn’t give up without twisting them. Curiously, the temple houses Hanuman, the Monkey God, commander of the monkey army in the Ramayana.

A few days after I learned that Hanuman is also Lord of the breath, Son of the Wind God, bears five faces and dwells within us in the form of five winds or energies, pervading our body, mind and soul...
in Light on Prãnãyãma by B.K.S. Iyengar

Back to Odder, the birds are still singing. The fields are becoming green as spring approaches.

I went to the mountains. There the crows croaked Kim has disappeared in a heavy snow blizzard. Thence none has heard his faith.

About the Buddhist bell that calls for Puja, as the shaved skulls gather in a half moon assembly, religious chants are sang in Buddha’s joy. The dark mahogany robes still in the sun, sat in unison near the large leaves of the fruit trees.

Female voices reciting religious chants are heard through the night.

The sweet and the salty tea
The nuns, the chomos, bring the food for lunch and dinner, by the earth path on which the Svastika and the four Jewels of Buddhism have been drawn. They do it every day at more and less the same time, slowly with no hurry, carrying sweet milk tea or the salty butter one to calm our thirsty souls.

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Around 1900, a Japanese Zen Buddhist monk travelled during a few years between India and Tibet. Here some of his comments.

About the Tibetan style of debating:

"... When he (one of the participants) utters the word of a question, he beats time with hands and feet. The teacher always teaches the catechist that the foot must come down so strongly that the door of hell (will) be broken open, and the hands must make so great noise that the voice of knowledge (will) frighten the devils all over the worlds..."
Ekai Kawaguchi

In Tibet, the Sky Burial consists in chopping the dead corpses into smaller pieces, and in leaving them in an open place to feed the vultures. Among Tibetan monks, some are responsible for this preparation.

"... They prepare tea, or help themselves to bake flour, with their hand splashed over with a mash of human flesh and bones, for they never wash their hands before they prepare to take tea or take food, the most they do being to clap their hands, so as to get rid of the coarser fragments. And thus they take a good deal of minced flesh, bones or brain, mixed with their tea or flour... When I suggested that they might wash their hands before taking refreshment, they looked at me with an air of surprise. They scoffed at my suggestion, and even observed that eating with unwashed hands really added relish to the food; besides, the spirit of the dead man would be satisfied when he saw them take fragments of his mortal remains with their food without aversion."
Ekai Kawaguchi

Everything looks clearer now that the midst has disappeared from my mind. The mountains are called mountains, the valleys, valleys and the snow peaks become sharper as they reach unseen highs. I have been blind for one thousand years, I was figuring unlikely landscapes and other images. Nonetheless, the way down deep into the valley is long but how extremely rewarding. Guide my foot on this journey so I may not lead astray.

I don’t trust those men who walk hand in hand in the street, and sit on each others knees.

My boat has been drowned by pirates on the river. Now I am wandering in the jungle for days without seeing any human trace. I’m probably walking in circles.

There is no future, no past but only and simply present, merely and mainly now, here and nothing more. No past memories, no forgotten experiences, no sorrow, no regret, no slavery, no attachment to the non-existing thus unattainable illusory future. But ever joy in present moment.

There is no way to portrait such beauty, only an infinite fraction can be memorized, despite of that fact, it boasts itself in front of our eyes, without anything that could be done to possess it.

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I cannot draw the insects nocturnal continuous noise nor the tropical unbearable heat.