Friday 15 December 2006

COLOANE

A cidade sobre o rio.
A chuva quando caía, batia nas chapas onduladas metálicas que serviam de telhado à maior parte das casas suspensas de Coloane. Caía durante horas com muito calor, numa espécie de monção sub-tropical.

No fim de tarde húmido e quente, a chuva deixara de caír, os sapos ouviam-se num barulho grave, uma linha melódica minimalista de três notas, os sapos saíam sempre depois da chuva. Eles comunicavam uns com os outros, através de três ou quatro notas sempre iguais, escondidos debaixo da janela. Insectos de todos os tamanhos e feitio apareceram sabe Deus de onde ao mesmo tempo e encheram o ar de terra molhada e follhas grandes de plantas tropicais.

Depois da chuva, o rio enchia-se de jacintos de água que ficavam a flutuar à deriva. E vinda dos Mares do Sul, uma cidade subia lentamente pelo rio acima. Tão lentamente que nem parecia mover-se. Como descrever uma máquina gigantesca nas suas dimensões, grotesca nas suas formas, morta e anunciadora de mau augúrio. Aquele amontoado de gruas, roldanas, rodas, correntes, placas de metal, toneladas de ferrugem, e tinta corroída subia o rio à procura de uma icógnita fatalmente aterrradora.

A cidade flutuava, e navegava ao som dos motores de aço.

a baía


A aldeia suspensa de Coloane. As casas de madeira estão suspensas por cima do rio das Pérolas sempre de cor duvidosa e turva, e do outo lado fica a China.

O céu, grande parte do ano era branco, o que torna a luz difusa, uniforme, sem contraste e sem sombras, a humidade sempre acima dos noventa por cento, as coisas em casa apodrecem lentamente. Os gordos, esses, sofrem mais, sempre senti compaixão pelo sofrimento deles. Os psiquiátras e psicólogos eram de praxe por entre a comunidade portuguesa, numerosas as depressões. Uma prisão de dezasseis quilómetros quadrados, e do outro lado, a China é infinita.

tufão


Um tufão visto da minha janela, a igreja de S. Xavier em Coloane, magnitude 8, bastante forte. As pontes fecharam, os acessos a Macau foram cortados, a população aconselhada a ficar em casa. Era costume voarem telhados de chapa no bairros pobres, e cuidado com os vasos. Convinha ter mantimentos para três ou quatro dias em casa, não se trabalhava, e a espera era longa.

vakei café


Torno-me apátrida a cada dia que passa. De tez estranha.

nga tim café




marginal


Depois do tufão, os jacintos de água à deriva em direcção ao estuário,
Depois de se terem infiltrados na cidade flutuante,
São agora levados pela corrente em direcção ao mar alto.



O carismático senhor Lei. Uma vez zanguei-me de manhã cedo e fui ao buda das quatro faces, fazer uma vénia, então ele sentou-se ao meu lado e permanecêmos calados, a olhar para o ouro da figura tailandesa.

casa de pasto chan


aldeia


os minibus


rusga aos pops ilegais


Um rusga num autocarro aos trabalhadores ilegais oriundos da China Popular, a mão de obra barata do território, importada ilegalmente para trabalhar a preços derisórios. A ponte Nobre de Carvalho e o capacete, os 98 por cento de humidade que cobrem quase sempre o território, uma autêntica sauna.

bastidores da ópera chinesa








barco dragão


Os treinos da equipa de barco-dragão de Coloane, no Rio das Pérolas. Ganhámos a regata de Macau, mas Myanmar venceu a prova internacional. Havia um português no meio do clã, talvez o único verdadeiro desportista presente. Os outros bebiam e fumavam muito. Estas fotos valeram-me as boas graças da máfia local, que como em qualquer outro país civilizado, apoiava de uma maneira ou outra, o desporto local. Antes de publicá-las, fui civilizadamente avisado para ter cuidado com o que escrevesse, por um mandarim local, o meu chinês não era assim tão mau quanto isso.

Por falar em aviso, a minha vizinha de baixo que era portuguesa, encontrou, um belo dia, a casa dela inundada, é de prática corrente deixar as torneiras abertas em casas de pessoas de quem não se gosta, não terá caído nas boas graças dos mandarins. Recordo-me andar lá a limpar, eu e um amigo, os estragos causados nas carpetes chinesas, as antiquidades e outros adereços, nunca se soube o que realmente aconteceu, lembrei-me desse "fait-divers" da pacata Coloane, podia contar outros que envolveram portugueses, ácido, tailandesas, láminas de barbear, toda uma lista.

Ofereci umas ampliações ao café dos locais, também ligados à associação desportiva de Coloane, que foram penduradas durante uns tempos, durante uns escassos momentos de glória. Locais esses que na altura da transição, a fase de entregue do território de Macau à China, descobriram uma nova afinidade com Pequim, visto que a administração desastrosa do governo, estava a empurrá-los neste sentido, mais preocupada em manter uma falsa propaganda sobre o bom entendimento entre as comunidades portuguesas e chinesas, e os vários séculos de cohabitação. O que iria tornar-se num discurso de disco riscado sem grande aplicações prácticas, enquanto na verdade encontrava-se a braços com uma criminalidade cada maior, e uma série de escândalos que abalaram os serviços de Macau.

desfile escolar


As escolas saiem à rua durante as festividades de Coloane. Por volta de 1997, acontece uma religação à China mãe mesmo sendo comunista, o que não se via uns anos antes. Bandeiras chinesas, o vermelho passa ser moda, os apresentadores de TV de Hong Kong fazem shows enormes usando uma variante do uniforme mao, mais moderna, talvez Yves S.Laurent.

No comments: