Tuesday 24 July 2007

Acerca do Dalai Lama

As vezes turistas vêm cá e trazem fotografias do Dalai Lama. Eu digo-lhes para não trazer tais imagens. Não é porque não quero ver sua santidade, porque nós o temos nos nossos corações. Eu digo aos turistas, se vocês querem mesmo fazer algo, ajudem-nos a preservar a nossa herança espiritual.

O Dalai Lama, sendo o único religioso como também o líder sécular dos tibetanos, goza de uma grande popularidade no mundo inteiro, devido à sua vasta sabedoria e à sua atitude exemplar em relação ao confrontamento da fatalidade do seu país, que ele espera resolver através de um diálogo constructivo com as autoridades chinesas, baseado no respeito pelos direitos humanos e o princípio gandhiano da não-violência. Apesar desta atitude positiva, as autoridades chinesas têm recusado durante anos de entrar em diálogo com o Dalai Lama, a quem eles chamam obstinadamente, o "cabecilha dos separatistas" e um "inimigo da China". O golpe em direção a uma política que coloca todas as cartas, desacreditando o líder do Tibete cujo país foi invadido, surgiu no final dos anos oitenta, quando a China viu-se a si própria, levada a suprimir os movimentos pro-independência no Tibete a seguir a um breve período revivalista dos assuntos religiosos. É verdade que a personalidade do Dalai Lama representa um símbolo unificador para o povo tibetano, e as autoridades chinesas encararam este facto como uma boa razão para tentar retirá-lo dos corações, e substituí-lo por uma lealdade forçada à unificada terra-mãe chinesa.

O Dalai Lama é receado pelo governo chinês por causa da sua habilidade para "internacionalizar" o assunto tibetano, o qual a China vê como um assunto doméstico. Em cada uma das suas viagens fora da Índia, o governo chinês mantém o olho posto na sua agenda, e expressa a sua desaprovação cada vez que o pode. Até um período de liberalização que começou no fim dos anos 70, a autoridade do Dalai Lama era mais ou menos aceite até ao terceiro fórum, no qual o Dalai Lama foi acusado de violar a doutrina budista, e de usar a religião para encorajar tensões sociais. O Dalai Lama, assim, tornou-se no culpado de qualquer recusa ou distúrbio incitado pelas políticas chinesas dentro do Tibete, retratando-o ao Ocidente como o líder das actividades anti-chinesas. Os grupos de suporte do Tibete costumam ser referidos pelos oficiais chineses como a "clique do Dalai".

Mas o Dalai Lama é mais do que um líder religioso ou secular para os tibetanos ou os seguidores do budismo tibetano. Segundo o budismo tibetano, as reincarnações do Dalai Lama são consideradas as encarnações de Avalokiteshvara, o Buda da compaixão. Este buda é venerado por budistas sem número do mundo inteiro, não apenas por budistas tibetanos, mas também por Mongois e nas repúblicas russas. Nas suas práticas espirituais, os budistas tibetanos estabelecem uma relação muito próxima, muito pessoal com o Buda da compaixão e o seu principal professor que, para muito deles, é o Dalai Lama. Assim, é muito natural, para muitos practicantes do budismo tibetano, de seguir os comentários eruditos do Dalai Lama sobre os tratados budistas, e de estudar os seus escritos a fim de obter concelho espiritual, e para obter uma maior visão interior sobre os complexos assuntos da filosofia budista.

O principal objectivo do partido parece ser de diminuir o papel do Dalai Lama e por consequência, o de qualquer alto lama religioso. E existem planos para um controle sistemático futuro sobre todas as reincarnações importantes dentro do budismo tibetano:

O governador da TAR (Tibetan Autonomous Region - Região Autónoma Tibetana), Qiangba Puncog, anunciou que Beijing escolherá o próximo Dalai Lama, um exemplo crítico da interferência flagrante com crenças e práticas religiosas.

Dado o papel chave do Dalai Lama e de outros lamas de alto nível, tem sido difícil para as autoridades chinesas, de ganhar o coração do povo tibetano. A fim de assegurar a legitimidade do domínio chinês no Tibete, foram adoptadas medidas para mudar as mentalidades das pessoas, que incluem a proibição da posse de fotografias do Dalai Lama, e da bandeira nacional tibetana na qual, referindo ao Dalai Lama, se lê: "O líder do Tibete, o país das neves, o grande protector, tesouro de tudo, possa-ele viver até ao fim do universo."

A polícia confisca todo o material impresso, audio e vídeo contendo ensinamentos do Dalai Lama, e os que possuem tal material, às vezes encaram tratamento abusivo, incluindo pancada e detenção.

Não somente as fotografias do Dalai Lama são proibidas na RAT, como noutras regiões, mas também as festividades muito populares do seu aniversário, no dia 6 de Junho, têm sido alvo de constrangimento há anos, argumentando que as celebrações do aniversário do Dalai Lama são essencialmente uma ferramenta política do Dalai Lama, e que as festividades poderiam afectar a estabilidade social.

Provas de como perigoso pode ser para os tibetanos de trazer consigo algumas fotografias e livros do Dalai Lama para uso pessoal, foram dadas em vários relatos de refugiados. Em 2005, o TCHRD recebeu um relato de Jigme Gyantso, um jovem monge tibetano, orignário do mosteiro de Bhashing, em Amdo. Após uma estadia para estudos no mosteiro de Sera no Sul da Índia, ele quis voltar com o seu irmão, um monge, para a sua aldeia natal no Tibete. Eles tinham toda a documentação necessária incluindo visas para várias entradas no Tibete. Depois de Dram, na fronteira tibeto-nepalesa, eles decidiram viajar num veículo alugado, juntamente com outro monge de Chamdo, Ten Nam, que também estava de volta para o Tibete.

"Depois de uma paragem para gasolina, os nossos papeis foram inspecionados e encontrados em ordem. Mas parece que o condutor do carro, informou os oficiais da PSB que eles eram exilados de regresso. No espaço de minutos, tivemos que parar e ficamos cercados por cinco PSB de pistola. Enquanto revistavam as nossas bagagens, encontraram várias fotografias do Dalai Lama e livros por ele escritos, que foram confiscados. Em Julho de 2001, fomos os três mantidos num quarto durante três dias, e electrocutados com vários ustensilos eléctricos, para o gado até ficarmos inconscientes.

Fomos espancados com cintos e placas de madeira, enquanto os oficiais nos interrogavam sobre a razão de possuirmos esses livros, e sobre a organização que estava por detrás. Os três monges foram acusados de incitar elementos contra o estado, entre as massas, e outros crimes que não comunicaram. No centro de detenção, foram torturados e alimentados com restos de comida. Eles receberam diferentes tempos de cadeia, que eles tiveram de cumprir na prisão de Drapchi, em Lhasa, famosa pelos seus particularmente crueis métodos de tortura. A memorização dos livros do partido sobre política e história tornou-se vital para a sobrevivência dos monges:

Ali, foram-nos dados livros sobre educação patriótica que tínhamos de memorizar. Se falhássemos em memorizar os livros, não nos dariam comida. A dieta era pobre e o inverno muito frio, o que causou severos problemas de úlceras. Como remédio deram-nos medicamentos fora de prazo.

Jigme Gyamtso e o seu irmão Tsedor foram libertados no dia 3 de Julho de 2005 e Ten Nam a 18 de Julho. Jigme Gyantso não foi autorizado a voltar para o mosteiro e está proibido de entrar em instituições e organizações governamentais. Depois de ter ficado na sua vila e ter estudado inglês durante quatro meses, ele conseguiu fugir para a Índia e planeia entrar num mosteiro no exílio.

Conclusão
Uma evaluação da situação do direito da liberdade de culto no Tibete, no ano 2005, forçosamente leva à conclusão, de que o nível de repressão religiosa atingiu um patamar subtil de manipulação, que coloca em perigo a continuação da essência das tradições tibetanas.

Numa entrevista em Dezembro de 2005 com a Reuters, o Dalai Lama salientou que o Panchen Lama apontado pelos chineses, "obviamente tem de dizer o que os seus superiores querem", indicando que, em contradição com as declarações do Panchen Lama chinês sobre uma cultura religiosa libre no Tibete, os abusos dos direitos humanos são ainda de norma no Tibete.

O prémio Nobel da Paz, hoje com 70 anos de idade, disse que estava triste pelos relatos de que monges eram mortos e torturados pelas autoridades chinesas, por recusarem denunciá-lo como um "separatista" empenhado em causar danos à China, e também salientando a repercursão traumática da forçada campanha de "reeducação patriótica":

"Eu tinha salientado que se eles tinham que me denunciar, então que por favor, me denunciassem, não há problema nenhum. A segurança deles é mais importante. Por favor, denunciam-me."

Falando em termos similares na inauguração do mosteiro Dolma Ling para monjas em Dharamshala. o Dalai Lama deu ênfase à importância da religião, exprimindo a esperança que o assunto tibetano pudesse ser resolvido, com base na não-violência, que é um princípio professado pelo Budismo tibetano e outras religiões do mundo:
O número de pessoas que aderem ao Budismo e ao Cristianismo na China e na Rússia, que durante décadas forçaram as pessoas a pensar que a religião era um veneno, está a aumentar... O Budismo pode realmente ajudar-nos a desenvolver um sentido de não violência e de mente de compaixão, tornando-nos ainda mais capaz de resolver a nossa situação amigavelmente.

in "Anual Report 2005", the Tibetan Centre for Human Rights and Democracy.

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