Tuesday, 26 December 2006
ÍNDIA
Muitas das alunas e professores são exilados provenientes do Tibete, actualmente ocupado pela China.
Esta é a "filial" de Dharamsala, mais precisamente de Odder, a 7 km de distância, situada numa zona de grande beleza natural, e que contava com cerca de 40 alunas. Estive durante 6 meses a viver no Instituto a ensinar inglês e com outros professores tibetanos de gramática e filosofia. Assití ao dia à dia de uma comunidade mutilada na carne e exilada num país que não lhes pertence, sujeita à inúmeros problemas. Devido ao facto de viverem de donativos, e logo à falta de tudo o que é necessário para o ensino, como livros, salas, quadros, entre outras coisas, surgem imensos problemas também de comunicação por causa da língua tibetana. Com perseverância e muito trabalho consegui chegar a um esboço de um qualquer resultado, infelizmente pela curta estadia dos professores voluntários, muita coisa deveria ser recomeçada de novo, sendo as bases muito frágeis para produzir um resultado frutífero.
Podia-se fazer mais, com mais tempo e mais meios, mas mesmo apesar de todas as dificuldades, o resultado é sempre positivo.
Para os eventuais interessados, coloco o link para o site da Jamyang Choling.
Sutras. Os escritos religiosos em língua tibetana. Exertos de textos que continuam a ser tema de debate, estudo e veneração por parte de toda a sociedade búdica tibetana.
Por volta das três, algumas alunas traziam o chá "doce" indiano, em contraste com o chá salgado tibetano, feito de leite de iaque e mainteiga salgada, uma iguaria para os paladares ocidentais.
Quando cheguei, em Outubro, estavam a decorrer os exames de Filosofia. Para o efeito, montaram um tenda grande com padrões tibetanos, e ocorrem ao ar libre no calmo ambiente do fim de verão. Consistem em exames escritos sobre a filosofia paramita mahayana budista própria do Tibete, Mongólia, Nepal e Norte da Índia, e consistem também em exames orais, os famosos debates budistas nos quais é usado toda uma simbologia de gestos e movimentos relativamente violentos que são supostos abrir as portas dos Infernos e afugentar os inúmeros demónios do panteão tibetano.
O edifício velho onde se situava a cozinha e alguns dos quartos das alunas assim como uma salinha para o telefone. O telhado era uma desgraça diziam elas, ouviam-se os ratos passear, mas o pior que podia acontecer eram as cobras; encontrar reptéis venenosos por entre as altas herbas do jardim também era um dos maiores medos das monges.
Uma vez apareceu, sabe-se lá de onde, um encantador de serpentes, vendia remédios e vários amuletos para males variados, o bichinho que saíu da cesta, quando ele se pôs a chamar, era nem mais que uma cobra real, das mais perigosas que pode haver, que se levantam e fixam com aquela expressão vazia, um autêntico fascínio.
Pus os sutras ao sol na varanda, envoltos em tecidos de ouro e carmim, os ventos encarregaram-se de os levar para os quatro pontos cardinais, assim como as palavras das bandeiras-rezas.
O director da instituição, um dos lamas de mais alto grau, e de extrema simpatia, aqui nas audições dos exames orais.
O primeiro professor de filosofia que quando cheguei, lá se encontrava. Viría a mostrar uma personalidade com fortes poderes, ele e a monge principal, eram capazes de feitos raros, não estámos nós a lidar com budismo tibetano...
A assembleia em meia lua depois de reunir debaixo das árvores de folha grande.
Um dos maiores problemas que tive com algumas das minhas alunas, algumas delas dos sítios mais remotos e pobres dos Himalayas, era em relação com a nossa sociedade moderna, o século XXI ocidental que nada tem a ver com uma mentalidade povoada de seres mágicos e espíritos maléficos. Tive muitos problemas em explicar o que era um semáforo, por exemplo, o que não é nada óbvio no meio da selva indiana. Também criei um incidente ao referir que os Himalayas "cresciam" mais um bocado todos os anos. Sendo a pedra matéria inorgânica, logo não viva como podia ela "crescer". Levantei violentos protestos na sala, o problema estava no magma e nos vulcões. O que são vulcões? Mais uma vez a falta de meios de informação estava a causar grandes problemas. Creio que o poder do Buda deu uma ajudinha ao assunto. Chegámos a um consenso, quase que fui linchado por causa desta.
O tenwa de 108 elementos.